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sexta-feira, 1 de julho de 2011

Corina Lopes

Produção para a “Oficina de texto narrativo” ministrada pela professora Cleide Montanini no Circuito do Livro no dia 06 de junho 2011. O texto destaque é do aluno Gabriel Lúcio de Oliveira o qual a professora teve o prazer de pegar em sua mão para cumprimentá-lo pela brilhante produção.

Corina Lopes


Contemplo a paisagem que se arrasta sobre a janela: campos, gado, serras e um céu acinzentado denunciando a chegada de uma chuva que limpará o céu de todas as suas impurezas. Não há sol. Minha casa, com todas as outras janelas fechadas, que está encoberta por um manto de escuridão que deixa cada canto de minha morada com um aspecto sombrio.

Espero a chegada da tempestade sozinha, alheia ao mundo, e inundada a pensamentos. Meu marido, o Lopes, é comerciante e foi à cidade cuidar de negócios. Provavelmente está ao lado de mulheres jovens e nuas que prefere chamá-las de clientes. Não tive filhos. Meu marido me condena todos os dias pela minha incapacidade reprodutiva. “Você não presta nem pra fazer uma única obrigação de uma mulher, Corina!” ,disse-me certa vez.

Quando me dera ter um filho que me fizesse companhia, que quebrasse todos os meus diários momentos de solidão com seu cálido sorriso. O beijaria. Abraçaria. Ouviria suas primeiras palavras com alegria. Aliviaria seu choros noturnos, com o medo de fantasia que só existem em seu imaginário. Só nós dois, nesta casa, e ninguém mais. Um ajudando o outro a suportar a vida.

Já tenho meus cinquenta anos. Meu corpo já esgotou o prazo para gerar uma vida. Terei de suportar o tempo que me resta sozinha. Durante o dia, sou só eu e meus pensamentos. À noite, meu marido mal me olha. Só tenho validade para cozinhar, lavar, arrumar e ceder. Quando me deito, meu marido sobe em mim e cessa todo seu desejo. Seus instintos sexuais arrancam minha roupa, e seus olhos ardentes contemplam minha nudez. Suas mão grandes e fortes personificam a força e agressividade masculina tateando todo meu corpo com violência. Depois de cumprida minha tarefa se vira, e dorme. A mim, só me resta o silêncio.

As nuvens já não conseguem suportar o peso da umidade. Chove. Raios descem da imensidão celestial e caem em direção ao nada, realizando estrondos imensos. As gotas de água que caem do céu não são mais pesadas que essas lágrimas que descem sobre minha face. Os raios que chegam do infinito não gritam mais do que meus pensamentos ocultos.

Sinto-me todos os dias ao pé desta janela e me ponho a pensar. Vejo sempre a mesma paisagem e imagino um mundo além das serras ao horizonte que não tenho esperanças em rever. Nutro-me da solidão, vivo de pensamentos, sobrevivo de ilusões. Sou uma mulher sentada junto à janela à espera da morte, pois a vida, a vida é breve. Breve como a espuma. Há muito me conformei com meu destino. Resta-me apenas aguardar o fim e o silêncio da existência.

Gabriel Lúcio de Oliveira

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